Já quis saber como melhorar sua escrita? Já se perguntou o que é um coach literário? A entrevistada desse mês, a coach Márcia Lígia Guidin, nos conta vários detalhes de seu dia a dia e de sua profissão! Confira a entrevista abaixo:
- O que é um coach literário?
O profissional que oferece coaching literário precisa, é claro, ter formação acadêmica e técnica, ter uma excelente redação e trazer excelentes soluções estilísticas — ou seja, ser um leitor crítico muito bem treinado para ajudar o escritor a encontrar o caminho certo. Muitos coaches também são escritores, e a formação como crítico literário sem dúvida é um diferencial.
O coach é menos um professor que dita regras e mais um conselheiro com quem o autor conversa, expõe dificuldades e apresenta ideias. O profissional equivale a um orientador na escolha de gênero, temas, leitor alvo e intenções do processo de escrita. Se for o desejo do autor, sugere pesquisas e leituras, além de aconselhar e acompanhar a eventual edição da obra. Mas, com certeza, a postura do coach é prática, não teórica, e a finalidade do coaching é o autor não precisar mais de coaching depois de algum tempo.
- Como é o seu dia a dia?
Bom, eu adoro o que faço. Recebo coaches, ou alunos-escritores como os chamo, das mais variadas frentes e desejos. Às vezes, poetas, muitas vezes escritores de prosa — conto e romance — e até autores de textos histórico-científicos.
Tenho uma sala para receber os escritores, que, acredito, é muito confortável. Lemos juntos parte da produção deles e dou sugestões de refacção ou elogio o texto com muita alegria (risos). Outro dia, uma escritora trouxe somente um conto. Ela achava que íamos ficar uma hora falando dele, mas, para mim, ele estava excelente. Pois não é que estava perfeito? Meus elogios são muito parcimoniosos — alguns me chamam de “Edward, mãos de tesoura”, mas elogiar caminhos certos é fundamental. Nunca atendo mais do que três autores por dia, dadas as outras atividades docentes que exerço.
- Em que consiste a leitura crítica de um texto ou obra a ser editada?
A leitura crítica é um trabalho essencial, na minha opinião, para as casas editoriais e para os autores. Tenho mais de 30 anos de experiência nesse trabalho, que era comum nas editoras nos anos 80 e 90, mas que tem sumido das estratégias editoriais atuais.
A leitura crítica ou parecer crítico consiste num relatório em que o leitor experiente ou especializado numa determinada área mostra os pontos positivos e negativos da obra — ou falhas, necessidade de emendas… —, a coerência com o tipo de leitor com quem o autor deve “fazer o pacto de leitura”, a relevância da obra no mercado editorial etc. Se a leitura crítica for positiva e mostrar que a obra terá seu lugar nas livrarias, aí, se necessário, a editora contrata o coach — apesar de ser raro hoje, infelizmente — para “conversar” com o autor. É necessário dizer que o leitor profissional, ao trabalhar para uma editora, nunca sabe o nome do autor cujo texto está analisando. Ou seja, a busca de isenção crítica é total, a não ser em casos em que a obra já esteja editada em outra língua. Nesse caso, o leitor recebe o livro original, onde está o nome dum “cara” de outro país. Eu, por exemplo, já li muita autoajuda estrangeira.
Se o leitor crítico tiver sido contratado diretamente pelo autor, ele deve também, com toda a elegância, dizer a mais pura verdade: não se pode receber só para elogiar um texto com problemas. Elogios vêm da família, dos amigos, eu vivo dizendo. O parecerista (como é chamado o leitor crítico) tem que ser um “advogado do diabo” para ajudar seu autor. Nestes anos todos, eu sempre falei a verdade, mostrei como mudar, e 98% dos autores gostaram muito dessa postura “exigentíssima”.
- O que leitura crítica tem a ver com coaching?
São duas ações diferentes. A leitura crítica pode se antecipar a algumas sessões do coaching. Se há desejo verdadeiro de se fazer literatura (e não somente um diário, um desabafo, um texto mais ou menos para blog etc.) e o autor iniciante não sabe direito como se expressar por qualquer razão, eu sugiro que, depois da análise crítica, ele faça coaching, de preferência não comigo para não haver um só leitor na atividade literária, ainda mais porque a segunda leitura NUNCA será igual à primeira. A segunda leitura já “sabe o final da história”. O parecerista estaria dando spoiler a ele mesmo. Assim, eu confio muito mesmo na primeira leitura. E a segunda, depois de refacções, tem de ser de outro profissional. A Miró Editorial tem quatro coaches e leitores críticos especializados.
- Você consegue enxergar o potencial de um texto já em uma primeira leitura?
Sim! Já na primeira leitura você sabe se o texto é bom, ou será bom, ou ficará ótimo. Deve-se enxergar o desejo estético do escritor, quer dizer, a busca pelo caminho para fazer literatura de verdade. Não é só sair escrevendo. A forma tem de estar em consonância com o tema.
- Por que decidiu trabalhar com autores? Tem alguma história que te marcou?
Comecei a trabalhar com autores porque fui coordenadora de coleções paradidáticas na editora Ática nos anos 80 e 90. Conversei com professores que eram autores muito importantes, e fui me sentindo cada vez mais segura. Mas vale dizer que já era professora universitária, já trabalhava com texto nas aulas, já orientava alunos. Ou seja, orientava, mas fui orientada muito bem.
- Como você começou os cursos de escrita criativa? É difícil ministrar um curso com estilos de escrita diferentes?
Isso foi por acaso: a Marisa Moura, uma agente literária, me enviou um autor que ela achava que poderia escrever melhor. Esse autor veio para encontros, escrevia romances, e depois a ele juntaram-se outros dois com interesse muito similar, e acabei tendo oficinas de escrita criativa deliciosas.
Por alguma razão que desconheço, as pessoas que se inscrevem são parecidas, ou seja, combinam umas com as outras. Várias já publicaram várias obras, mas algumas querem continuar por aqui. Às vezes, dou um “diploma” para que elas escrevam sozinhas. Elas ficam bravas… E ninguém tem menos de 45 anos… Uma das grandes escritoras que esteve aqui produzindo e editando tem agora mais de 80 anos. Um orgulho.
- O que você acha do processo da autopublicação?
A autopublicação é tão legítima quanto qualquer outra forma de publicação. Há muitos escritores bem famosos mundo afora que pagaram ou tiveram patrocínio para sua primeira publicação. Posso citar muitos: Bandeira, Drummond, até Paulo Coelho, acredite. Não vejo motivo para vergonha, não vejo motivo para bullying nem demérito. Acontece que editoras de fundo de quintal, com gráficas indecentes, têm sido procuradas por autores inexperientes. Precisa separar o joio do trigo, e é importante que todo tipo de livro receba uma leitura de uma pessoa especializada.
- Por que você recomenda a Editora Labrador?
Recomendo a Labrador a vários dos meus coaches e amigos escritores porque é uma editora seríssima, sabe fazer livros, propõe preços muito justos e tem o que é essencial: orgulho de seu selo. Portanto, não cometerá deslizes, fará uma ótima edição, e só depois de aconselhar devidamente o autor. O Daniel Pinsky vai publicar um livro meu, que está esgotado, ainda este ano!
Estimulante esta entrevista com a Márcia Ligia Guidin!
Trabalho importante, possível apenas aos amantes da palavra escrita…